Zonas erróneas [4]
Rascunho no seu pior (2)
Quando conheci o André (nome fictício) tinha a mania (sabe-se lá porquê) que queria ser cantora. Ele era o vocalista da banda onde eu fazia segunda voz. Ok, já estão a ver o filme todo: um clássico. Ele era giro (muito giro mesmo), tinha aquele letreiro na testa (ou eu imaginei que tinha) e um dia, depois de um ensaio e de um jantar com copos lá acabei por aceitar a boleia dele para casa... Pensam que estão a ver o filme? Estão enganadas.
Antes de chegarmos a minha casa ele pergunta-me com um ar engraçado: "Queres ir ver o mar?" Eu disse que sim e lá fomos os dois a caminho do mar com a música dos Morphine a bombar na k7 (ok, já sou cota). Era Verão e estava uma daquelas noites muito quentes. Pelo caminho achei que devia estar a ficar louca por ir àquela hora para a praia com um gajo.
Quando estacionamos reparo que não estávamos em frente à praia, mas sim num daqueles miradouros com vista para o mar, com montes de carros ao lado a abanar a todo o gás - o que me decepcionou bastante... Confesso que estava a planear aquela cena de passear um bocadinho à beira-mar, quem sabe dar um mergulho...
"Então não íamos ver o mar?", pergunto-lhe meia irritada.
"E o que é aquilo...?", responde o vocalista a arfar no meu pescoço. Tento esquivar-me, pois aquilo tudo estava-me a começar a enervar... Os carros ao lado embaciados abanavam a todo o gás. "Vês?" - diz-me ele - "...eles estão a fazer o mesmo!" e continua a arfar no meu pescoço.
Eu fiquei indignada. Aquela ideia de fábrica de pinanço num miradouro de engate subiu-me ao nariz como mostarda. Aquela não era definitivamente a minha onda, com todo o respeito aos amantes dos miradouros. Vai daí que ele, sempre a arfar no meu pescoço, sai-se com esta: "Não te preocupes, já vim aqui montes de vezes e nunca houve problema nenhum!"
Eu não queria acreditar: "Já vim aqui montes de vezes." Foi a gota de água. Irritei-me mesmo e obriguei-o a dar meia volta e a levar-me a casa. Desculpem lá, até pode ser giro a cena do "pró que é que é", mas é preciso ter um certo requinte... É claro que nunca mais fui a nenhum ensaio da banda e é claro que nunca mais olhei para a cara do anormal.
Mas esperem que o pior está para vir: passado uns anos vi-o num jornal, onde deu uma entrevista (ao que parece agora é músico famoso) e não é que a foto tinha sido tirada no sítio onde ele ia "montes de vezes e nunca houve problema nenhum"! Na legenda dizia: "André num dos seus locais preferidos de inspiração." Desculpem, não dá.
Etiquetas: [R]
2 Comments:
“músicos” estão para os “dates” como a palavra “aleijar” está para o dicionário, ambos deviam ser abolidos das nossas vidas.
P
Tu não "mo lo digas" amiga! ;-)
R.
Enviar um comentário
<< Home