2.6.08

Um tia no Rock in Rio [2]

(cont...)

A amiga lá estava, soterrada em seguranças. Tiveram que gritar e acenar com o bilhete para que uma segurança o viesse buscar. As três juntas at last. «A partir de agora, desligam-se os telemóveis e acabam-se as combinações.» Agora é que começa o “festival” como se diz na tenda vip. Concerto é no relvado. Espectáculo é só depois. Magotes de pessoas saem do recinto, cheios de filhos, a próxima actuante não é para mais novos. Nova entrada na tenda vip. Mostrar outra vez a pulseira a sete guardas. Comer, comer. A larica apertava. Cabeças voltavam-se para ela. Cumprimentavam-na. «Tá boa?» «Obrigadíssima», optou por responder, sempre a andar. Depois lembrou-se, pintara o cabelo de loiro. Muito loiro. Loiro-holofote. Era por isso que a confundiam. «A Karen Jardel é mesmo gira, a sério. E as pernas da Malu Madder, alta! Cabra. E o vestido daquela. E o cu da outra? E as tias e a moda Amy, modernas!» Não sei se de propósito, uma senhora muito sonora entorna pelas costas da tia meio copo de cerveja. «Não faz mal. Acontece», grasna a tia. «E quem avisa aquela tia que o tagliatelle que leva ali em prato cheio, é só acompanhamento... cozidinho com água e sal?»
Ninguém liga às gargalhadas demasiado altas da tia. Ainda bem. Mas havia ali algum desconforto. O chão parecia trepidar. E o barulho era constante. Parecia-lhe estar dentro de uma máquina de lavar. Comeram à pressa. E beberam, não era permitido sair com copos ou garrafas do recinto vip. «Está certo, forretas.» O nervosinho começava a adensar-se. Lá para fora, que não queriam perder o início. Andaram quilómetros para escolher o melhor lugar, optando pelo primeiro, junto a um enorme ecrã, entre um caminho e o relvado em abrupto declive. Estavam bem dispostas. «Ó rapaz, não te sentes na lama, nem sabes o trabalhão que essa nódoa dá a lavar.» Muitos casais, muitos grupinhos animados, ora de meninas ora de rapazes. Pessoas da idade da tia e miúdos, só isso. Cheiro de erva, só o que saía do baseadinho das três. Os “festivais” já não “cheiram” ao mesmo.
Três teenagers em gritinhos pedem-lhe um tampão. «Não tenho, mas no meio de noventa mil pessoas deves arranjar.» E depois para as duas amigas: «Oiçam lá... Estaremos com ar de quê? Tias muita giras com um ar super descontraído ou somos as únicas neste perímetro com ar de quem tem tampões na mala?»
Começa por fim Mrs. Amy Winehouse, depois de quarenta minutos de espera, onde só se ouvia «ela não vem». Encaram o telão.

Quem olhasse para a tia, não lhe lia a alma... em cacos. A sensação que tinha era que estava a ver um filme, daqueles muito previsíveis e de baixo orçamento. Ou uma novela da TVI... daquelas muito más, que se sabe sempre o que vem a seguir. Tentou alhear-se. Voltou as costas ao ecrã. Não dava resultado. As pessoas falam demais. As pessoas vão aos concertos para falar. A cena continuava a desencadear-se com todos os chavões. Meteu conversa com as duas, tentava abstrair-se. Falaram de outras coisas, a disfarçar. «Acabou por fim», pensou a tia enquanto se dirigiam para saída número três. A terceira não queria mais ficar.

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