Plft-ploft. Oui, oui, ne me quite pas.
Fui de fim-de-semana a casa dos pais. Como o X. não foi decidi levar o Ronaldo. Ele estava nervoso. Era a primeira vez que ia de fim-de-semana à minha família.
Ronaldo veio de Paris e fala francês comigo. "Oui, oui, ne me quite pas" Ronaldo foi a única coisa boa que me aconteceu nos últimos tempos. E as 5ªs feiras, claro.
Não sei o que se passa comigo - vocês já notaram na 5ªf passada - mas não ando muito bem. Estou hipersensível a tudo, permeável a tudo, tudo me comove, até anúncios publicitários pirosos. Fico na cama até ao meio dia (o que não é nada meu). Não atendo o telefone a ninguém. E só saio da cama porque tenho fome. Acho que é de andar a trabalhar pouco. Não sei. Será menopausa? Não me reconheço.
A única coisa que me vale é o meu Ronaldo que está sempre disponível para mim. "Oui, oui, ne me quite pas". E as 5ªs feiras, claro.
Fui de fim-de-semana a casa dos pais para ver se melhorava mas não ajudou nada. Ok lá estou eu: o drama, a tragédia, o horror.
Mal cheguei à rua dos meus pais vi ao longe o C., o primeiro amor da minha vida, todo fodido, fodido mesmo por causa das drogas e eu fiquei logo toda destruída. Quando chegámos perto um do outro C. nem se quer teve coragem de me enfrentar. Baixou a cara. Teve vergonha, medo, sei lá. E eu, feita totó, também não tive coragem de lhe dizer nada. No momento em que passei junto a ele e o meu coração ficou destruído, estraçalhado.
Quando os meus pais chegaram a primeira coisa que me disseram foi que eu estava a ficar "gordita". Eu encolhi os ombros e pensei: os pais adoram fazer estes comentários desagradáveis sem saberem que estão a ser desagradáveis. Mas a minha irmã veio tentar compor o ramalhete e disse: "Só estás mal no rabo... e tens um bocadinho de barriguinha." E pronto aquilo caiu que nem uma bomba. Tudo bem, eu sei que parei a hidroginástica, que as calças me ficaram mais justinhas, que as minhas pegas do amor estão mais salientes, mas daí a fazerem disso um tema de conversa de família? Fiquei destruída. Ou mais destruída ainda. A palavra gorda sempre me caiu mal. Nunca gostei dela. Gorda. Comecei a sentir o meu rabo lá atrás enorme a fazer ploft-ploft. Gorda.
Passado um bocado comecei a relativizar. É claro que eles estavam a exagerar. Fui a casa da L., a minha amiga de infância, e a primeira coisa que ela disse foi: "Estás mais gordita". Saí de casa da L. com o rabo ainda maior e a fazer "PLOFT-PLOFT" ainda mais alto. Gorda.
Decidi fazer um bolo, o qual mal lhe toquei. Gorda. O gás acabou a meio da cozedura, esqueci-me da manteiga, o caramelo queimou-se, enfim, correu tudo mal. No meio desta trapalhada toda a minha mãe começou a stressar comigo e com o bolo e eu passei-me com ela e com tudo e gritei-lhe: "JÁ CHEGA". Não por causa do bolo, claro. Gritei pelos quilos a mais, pelo rabo, pela barriga, pelo C. que está todo lixado com as drogas, por não lhe ter dito nada, por andar meia maluca, sei lá, gritei-lhe por tudo e por nada e já não havia nada a fazer a não ser pedir-lhe desculpas.
Claro que as desculpas, para mim não bastam. Vocês jé me conhecem. Fiquei a remoer o dia inteiro. A noite inteira. A culpa do catolicismo é veneno. É ácido. Corrói.
Passei o resto do Domingo a comer e a sentir o meu rabo a crescer. Ploft-ploft a tarde inteira. Não fui visitar mais ninguém com medo dos comentários. Gorda.
À vinda, fiquei uma hora na estação à espera do Intercidades. Uns estudantes bêbados que vinham da Queimas das Fitas olhavam para mim como quem diz: "Ganda rabo". Fiz um esforço para parecer que os estava a ignorar.
No comboio comecei a ler "Acoua Toffana" da Patrícia Melo. A personagem é completamente louca, doentia, hipocondríaca, ciumenta, maluca de todo. Aquilo vinha a dar cabo de mim, a história, o enredo, os medos, as angústias. Reconheci-me em tantas coisas, no ficar na cama até tarde, nas paranóias principalmente. Não sei porquê o livro esfrangalhou-me toda. Cheguei a Lisboa gorda e esfrangalhada.
Em Santa Apolónia o X não aparecia à hora que tínhamos combinado. 11 e meia da noite e nada. Fiquei furiosa. Estou sempre à espera dele. Passo a vida à espera dele.
Não esperei mais. Meti-me a pé para casa. Também não é assim tão longe e além do mais andar faz bem ao rabo. Gorda. "Plof-plof" o caminho todo.
Enquanto andava lembrei-me do livro, dos assaltantes, dos sequestradores (a tragédia, o drama, o horror). Alguém passou de repente muito rente a mim e eu estava pronta para lhe atirar a mochila à cara. Pânico.
X lá apareceu a meio do caminho cheio de sal e areia. Tinha ido à Arrábida com uma colega fazer "réperage" e eu gorda e esfrangalhada à espera dele em santa Apolónia. No carro estavam uns óculos de gaja cheios de areia e pensei no livro, nas traições, no sapato que ela encontra no carro dele, mas era só um filme que eu estava a inventar na minha cabeça. E ciúmes também nunca foi o meu forte.
Acho que cheguei a casa e desmaiei na cama de cansaço.
Hoje acordei a pensar no fim-de-semana e senti-me destruída.
Destruída e gorda. Mais uma vez não me quis levantar. Fiquei na cama até às 11 e tal. Não atendi o telefone a ninguém. Sentia-me um caco humano e só pensava que me tinha de inscrever num ginásio. No budismo. No zen. Não sei. Qualquer coisa. Tenho de fazer qualquer coisa a isto que sou eu. Porque o mal não está no rabo, nem na barriga. Está na cabeça mesmo. Gorda. Mas de repente, algo me alegrou: o meu querido Ronaldo olhou para mim com aquele ar que só ele tem e sorriu. "Oui, oui, ne me quite pas".
(Desculpem o longo desabafo. Só vos digo estas coisas a vocês mesmo, pois sabem bem o que quero dizer e conhecem-me bem para me dar o desconto todo.)
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3 Comments:
Já me 'enscangalhei' a rir com o teu post, ainda mais do que com o do mitra do talho ;-D Se não fossem quase 2 da manhã ainda te ia bater à porta, eh eh!! 'Bora para o ginásio, eu vou-me inscrever no dia dos meus anos, por isso, daqui a uma semana a minha vida vai mudar completamente. Anda também, que aos pares é mais fixe, LOL - já estou a imaginar a desgraça!!!
'desculpa lá o desabafo mas.... F O D A - S E!!!! e eu a pensar que tinha dias difíceis!!.. anima-te miúda, o mundo não é só a preto e branco, todos os dias te acontecem de certo coisas bem mais formidáveis e merecedoras de recordar do que estes dias de merda.. cabeça para cima, amanhã é outro dia.
cumps'
Obrigada Elle e Mega.
Para quem não me conhece, parace que estou muito mal, mas não é bem assim. Eu posso estar mal, mas depois levanto-me logo e parece que nada me aconteceu. É uma espécie de surto que me dá.
Gosto de exagerar tudo, de por as coisas mais negas do que estão para depois olhar para trás e rir-me por ser uma exagerada (daí "o drama, a tragédia, o horror!").
Além do mais sempre preferi os anti-heróis, os toscos e os tótós em geral. Identifico-me mais.
Brigada. R.
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