18.7.08

Coisas que me fazem sentir cota [1]

Apesar de ainda me sentir uma miúda eu sei que já sou cota.
Vocês vão dizer que sou uma exagerada, que aos trinta e quatro não se é nada cota, mas eu sei que já estou nesse grupo, quer queira quer não. Ok, tudo depende da perspectiva. Se forem perguntar a alguém de cinquenta anos vai dizer que ainda sou jovem. Se forem pedir a opinião a uma septuagenária (gosto tanto de dizer septuagenária) ela vai dizer que ainda sou uma menina. Agora experimentem perguntar a alguém de vinte e poucos anos se uma pessoa de trintas e tais é ou não cota e vejam a resposta. Já nem falo nos teenagers que nos acham autênticas múmias.
Lembro-me tão bem de ter 16 anos e de estar completamente apaixonada pelo meu professor e História (um clássico) que tinha trinta e três anos e que o único "se não" era ele ser "bué de cota". Também me lembro de ser criança e de pensar que no ano dois mil - aquele ano mítico e longinquo, que já passou há oito anos - ia ter 26 e isso era "bué de cota".
Não vale a pena entrar em negação, eu sei que sou cota e tenho de aceitar isso. Então porque e que às vezes já me chamam senhora? Então porque é que já não me perguntam na CP ou nos museus pelo meu cartão jovem? Sim, e porque é que quando vou à Séfora comprar creme para o contorno dos olhos já ninguém me diz que "ainda é cedo"?
E é a falar que eu topo as minhas cenas de cota. Pela boca morre o peixe. Sempre que uso uma expressão de cota a cota que há em mim arrasa completamente a miúda que vive lá ao lado (imagino as duas num ringue de box).
No outro dia, a falar com um teenager sobre a escola, caí no erro de dizer: "escola primária". A cara de espanto que o miúdo fez. "Escola quê??" (Cota: 1/Miúda: 0). Lembrei-me logo dos meus pais quando diziam "no meu quinto ano".
Em conversa com o filho teenager de uma amiga perguntei-lhe qual era a discoteca que ele costumava ir, ao que ele me responde com um ar paternalista: "Já não se diz discoteca R. Dizes só o nome do sítio e pronto". (Cota: 2/Miúda: 0). Naquele momento senti-me aquelas velhas que diziam "boîte" em vez e discoteca (lembram-se?). Lembro-me de "boîte" soar a mofo.
Também já não se diz cassete. Pior: já não há cassetes. E os teenagers olham para as cassetes com o mesmo ar de fascíneo como nós quando olhávamos para as bobines de super8 dos nossos pais.
No Porto uma amiga deu-me boleia para casa. Com ela ia a outra amiga com uma sobrinha de 12 anos (que ia toda contente por já poder andar no carro à frente). A miúda olhou para as cassetes no carro maravilhada e disse: "UAU! Quando era pequena a minha tia também tinha disto no carro!"
Já não se diz teledisco. "É muito anos oitenta", ouvi há uns tempos uma miúda dizer à mãe no tom mais depreciativo do mundo. Diz-se vídeo ou só clip. Também já não se diz se quer disco, porque também não há discos (vinil, pelo menos). Enfim, já não se diz um monte de coisas que "no meu tempo" se dizia. E só o facto de dizer "no me tempo" já me coloca no meu lugar.
A falar com uma amiga sobre o preço da minha casa falei em contos, escudos portanto. A filha da minha amiga, de nove anos, pergunta-me a gozar: "Contos? Contos e quê R.? De fadas?" Senti-me tal e qual aquelas velhas que diziam mil reis e eu achava aquilo do século passado. (Cota: 3/Miúda: KO).
A verdade é que eu sou cota e sou mesmo do século passado. A verdade é que no meu tempo usavam-se expressões (e que algumas às vezes ainda uso) muito diferentes das de hoje. Já não se diz discoteca, disco jokei, disco, cassete e teledisco. Já não se diz escola primária, primeiro ano do ciclo, liceu. E muito menos escudo, contos, reclames e outras que agora não me lembro e que fazem de mim uma cota. Se calhar até já é cota dizer cota...

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3 Comments:

At 2:09 da tarde, Blogger nando said...

Iááááá pá! podes crer... Eu quando era pequeno também tinha uma tia... que era cota!!! Já nem me lembrava disso... ;)

A sorte é que os homens sempre são como o Vinho do Porto, não têm esses stresses...
:D

 
At 6:27 da tarde, Blogger Unknown said...

E eu que entrei nos entas... super-cota.
Vim a este espaço por acaso, gostei do post e voltarei em breve, entretanto convido a uma visitinha no nosso.
Ana Cristina

 
At 3:51 da tarde, Blogger Clara said...

Pois é..apercebemo-nos que estamos a ficar mais velhas e iguais aos nossos pais:))
Bjks

 

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