11.4.07

E porque falamos a mesma língua [1]

Em Portugal se diz assim
«(...) Pagar a renda do andar é pagar o aluguel do apartamento. O avião não decola, descola, e não aterrissa, aterra; e o sujeito que vem consertar a pia não é bombeiro, é canalizador. (...) Sua geladeira deve ser promovida a frigorífico e seu banheiro a casa de banho. (...) Caminhão é camião, e quando ele bate não bate, embate; seu motorista é camionista. A casa (mobilada e não mobilada) vende-se com “o recheio”. Oferecem-se marçanos e turbantes, e mulheres-a-dias. Lanterneiro é mais logicamente bate-chapas e cardápio é ementa; esquadra é a delegacia de polícia. (...) Caixa postal é apartado, aparelho de rádio é telefonia, parada é paragem e pedágio é portagem; carona é boléia, autoclismo é caixa de desgarga de latrina, que não é latrina, é retrete. (...) suéter é camisola, e meia de homem é peúga, (...) mamão é papaia, troco é demasia, presunto cozido é fiambre, sorvete é gelado, travão é freio, marcha a trás é marcha à ré, band-aid é penso, e durex é fita-cola, bonde é eléctrico, berlinde é bola de gude (mas é masculino: jogar ao berlinde), cabedal é couro. (...) a sopa não esfria, arrefece; tomada de electricidade é ficha; (...) a guimba ou bagana de cigarro no Brasil é beata em Portugal, e a equipa não deixa a concentração para fazer um excursão, deixa o estágio para uma digressão; papel carbono é químico, não se diz que um sujeito é monarquista, diz-se que o gajo é monárquico.
Quando dizemos que “tinha muita gente lá”, eles dizem que “tinha lá imensa gente”, quando falamos de “uma porção de coisas”, eles falam de “uma data de coisas”. Não se anuncia uma casa “em primeira locação”, mas simplesmente “a estrear”. (...) O final de um jogo de futebol de futebol não é “zero a zero”, é “zero-zero”. A nossa ducha é o duche deles, e o nosso toca-discos lá é gira-discos. (...) e não se dá uma surra ou uma sova, mas uma tareia. Pois, pois.»

Ruben Braga [1913-1990], Pequena Antologia do Braga,
Editora Record, 7.ª Edição, 2004

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